RESPIRE COMIGO ESSE SILÊNCIO

                                   a Sebastião Moreira Duarte

Escuta, amigo, sente aqui. Sim, aqui, mais perto.

Não, por agora não quero conversar.
Quero apenas te ter aqui por perto.

Não. Também não quero ouvir nem declamar
o mais belo dos versos desta e doutras línguas
E mesmo o flautim agora não convém.

A tua fleuma agora é todo o meu conforto:
esse teu jeito de me olhar tão compassivo –
que serena todo esse belo e absurdo da vida:
infinito desassossego louco dentro do globo,
dentro do qual giramos e nos perdemos.

São motores roucos a mover alucinantes dias
que zunem ruídos em fagulhas inquietas.

Estou cansado dos cumprimentos protocolares:
busco olhos que me fitem demoradamente,
estes teus olhos amigos que dispensam o verbo,

sem nada indagar, sem nada querer além de olhar:
que olham apenas para ver e sobretudo sentir.

Senta aqui e me dispensa de escrever mais um poema
sobre amizade: já basta o que disse dela Cícero e a Bíblia.

Vem, amigo, senta aqui: respire comigo esse silêncio
de frescor e paz.